Para as lideranças do povo Kaingáng presentes na Consulta Pública para elaboração de um protocolo comunitário inédito entre os Kaingáng, “tudo começa pela educação: a formação de lideranças, de professores, mulheres, jovens, adultos compromissados com a comunidade”, pontuaram.
O último dia dos trabalhos com a Consulta Pública nesta sexta (06), em Londrina, no Paraná, teve como foco a aprovação do Contrato de Licença de Uso de Expressões Culturais Tradicionais Kaingáng e da Repartição Coletiva de Benefícios pelo uso dessas expressões em obra audiovisual.
A consulta é liderada pela Organização Indígena Instituto Kaingáng – Inka, e seu Ponto de Cultura Kanhgág Jãre (Raiz Kaingáng), junto da Organização Indígena Juventude Kaingáng Nẽn Ga, da Terra Indígena de Apucaraninha (PR), e Instituto Indígena Brasileiro para Propriedade Intelectual (Inbrapi).
O planejamento e organização das Consultas vem ocorrendo há meses, sendo a do Paraná a primeira das quatro que serão realizadas nos demais estados onde habita o povo Kaingáng no Brasil: Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo.
A participação de indígenas Kaingáng nesta primeira Consulta, cerca de 40 indígenas, atendeu a diversidade de organizações e coletivos Kaingáng do Paraná, prevendo equilíbrio de gênero, incluindo artesãos, anciãos, acadêmicos, professores, lideranças tradicionais e grupos culturais.
Oficina de Teatro
Foram apresentados os resultados da Oficina de Teatro do Oprimido, coordenada pela artista e escritora Vãngri Kaingáng junto aos professores indígenas participantes da Consulta, com enfoque no papel das mídias digitais no contexto de povos indígenas.
“Esperamos levar esse trabalho de mãos dadas, com a união de vários Kaingáng para outras comunidades indígenas que ignoram os nossos direitos e a nossa capacidade de usar as mídias digitais para divulgar a nossa questão cultural, valorizando nossa arte, nosso grafismo, língua, costumes e tradições em qualquer parte do Brasil e do mundo”, afirma Vãngri.
Contrato de Licença
As lideranças indígenas participantes da Consulta Pública entraram em consenso após os dias de discussão, de que a educação (com foco na formação de professores), deve ser a prioridade do Contrato de Licença de Uso de Expressões Culturais Tradicionais Kaingáng e Repartição Coletiva de Benefícios na obra audiovisual a ser realizada pela Produtora Floresta.
“Tudo começa pela educação: a formação de lideranças, de professores, mulheres, jovens, adultos compromissados com a comunidade, orientados pela experiência dos kanhgág kofa, os velhos Kaingáng. Então essa é a prioridade”, acordaram as lideranças Kaingáng no local.
Os participantes indígenas reconheceram que estão diante de um desafio nunca antes encarado pelo povo Kaingáng, por ser esta, a primeira vez que uma empresa realiza uma consulta prévia, livre e informada entre os Kaingáng para o uso de expressões culturais em uma obra audiovisual que pretendem realizar, uma boa prática que é um direito coletivo destas populações como povo indígena diretamente alcançado pela iniciativa.
Para Nyg, da Organização Indígena Juventude Kaingáng Nẽn Ga, “estamos vivendo um outro tempo e apoiamos esta iniciativa audiovisual, pois mesmo que haja erros, essa consulta servirá de marco histórico e devemos seguir sem medo e que a iniciativa traga visibilidade e valorização para toda a cultura indígena Kaingáng”, afirmou.
A anciã Gilda Kuita da Terra Indígena de Apucaraninha (PR), reforçou o cenário de mudanças vivenciadas pelo Kaingáng, “temos de reagir e essa formação é urgente para tirar um pouco esse medo de errar, de criticar, de alguém criticar você. Nós indígenas somos muito inteligentes, mas não nos achamos inteligentes e estamos tendo oportunidades de expressar isso, temos de buscar na cultura, vamos aprender”.
A Fundação Nacional do Índio (Funai) e Ministério Público de Londrina, no Paraná, declinaram do convite para participar da Consulta Pública presente.
A próxima Consulta para elaboração de protocolo comunitário de uso de expressões culturais tradicionais kaingáng e de repartição coletiva de benefícios será em Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, nos dias 10 e 11 de janeiro.
Escrito por: Sônia Kaingáng, jornalista indígena independente, especializada em Educação, Diversidade e Cultura Indígena. Cobre temáticas indígenas em Educação, Patrimônio Cultural, Conhecimentos Tradicionais e Biodiversidade, tendo atuado profissionalmente em organizações indígenas nas regiões Norte, Centro-Oeste e Sul. Atualmente pelo Instituto Kaingáng – Inka.