Em uma iniciativa para valorizar a cultura e a educação Kaingáng e propor uma repartição coletiva dos benefícios pelo uso de expressões culturais tradicionais em obra audiovisual, participantes dos diferentes segmentos do povo Kaingáng do RS se reúnem em Consulta Pública nesta terça (10), em Passo Fundo.

As Organizações Indígenas Instituto Kaingáng – Inka, o Ponto de Cultura Kanhgág Jãre (Raiz Kaingáng), e o Instituto Indígena Brasileiro para Propriedade Intelectual (Inbrapi), seguem com a realização das Consultas Públicas junto ao povo Kaingáng nos quatro estados onde habita no Brasil, sendo a vez do Rio Grande do Sul (RS).

A primeira Consulta foi realizada ao povo Kaingáng do Paraná (PR), na cidade de Londrina, nos dias 05 e 06 de janeiro, e ocorre agora com o povo Kaingáng do RS em Passo Fundo, nesta terça (10) e quarta (11).

A Consulta tem por objetivo a elaboração de um Protocolo Comunitário que defina as regras para o Uso de Expressões Culturais Tradicionais Kaingáng em obra audiovisual e a discussão da Repartição Coletiva de Benefícios pelo uso dessas expressões culturais tradicionais, uma boa prática que nunca ocorreu entre o povo Kaingáng.

Um dos motivos para isso é que o Kaingáng é um povo numeroso, considerado o terceiro maior em população indígena do país, com cerca de 60 mil pessoas, sendo um desafio para este coletivo encontrar um consenso, como aponta o cacique Adilson da Terra Indígena Inhacorá.

“A gente não consegue alcançar objetivos porque não há um consenso. Precisamos alavancar isso, somos um povo que tem valor, que tem cultura e a unanimidade não deve nos preocupar pois sempre há pessoas que concordam e discordam, e muitas vezes não fazemos por medo de represália”, pontuou o cacique.

Roda de Conversa

A programação da Consulta contou com uma Roda de Conversa onde esteve a presidente do Inka, Andila Kaingáng, a membro do Inka e advogada Susana Fakój, o professor indígena Kaingáng e historiador Bruno Ferreira, a representante da Comissão dos Direitos Humanos de Passo Fundo, Leci Albany, e o advogado e membro executivo da Produtora Floresta, Thiago Pedroso.

“Muitos projetos têm sido desenvolvidos no Brasil sem o consentimento dos povos indígenas, como é o caso do povo Kaingáng. Não teríamos como subsidiar uma reunião com 60 mil indígenas Kaingáng, mas podemos reunir uma representatividade”, explicou Susana Fakój.

Para Leci Albany, “o povo indígena Kaingáng é um povo acolhedor, guerreiro, que luta, que tem na raiz o partilhar, e isso vem da cultura. O nome de vocês tem de ser sempre resistência”.

Thiago Pedroso da Produtora Floresta, esclareceu que o projeto audiovisual em questão na Consulta Pública está em fase de desenvolvimento e que deve trazer elementos da cultura indígena Kaingáng. “Somos a primeira produtora no Brasil a perguntar se vocês aceitam isso ou não”, reforçou.

Plenária Indígena

Lideranças indígenas, anciãos, professores, acadêmicos, mulheres, jovens e crianças estão presentes na Consulta Pública em Passo Fundo.

A profissional aposentada da Saúde Indígena Albertina Sales, da Terra Indígena Borboleta em Salto do Jacuí é uma das participantes e afirma, “tudo que veio como prato feito para nós não foi bom. Depois de tantos anos de movimento, esta é a primeira vez que estou sendo consultada. Não quero mais ver as nossas marcas, as nossas mulheres, os nossos homens, os nossos velhos sendo desrespeitados. Somos os filhos originários, merecemos, queremos e exigimos respeito por parte de quem seja. Está na hora de nós mesmos termos a coragem de enfrentar e lutar pela coletividade, que traga algo positivo para o nosso povo”.

“É o momento de nós construirmos juntos”, enfatizou o professor Valdomiro Mineiro da Terra Indígena Inhacorá.

A programação da Consulta Pública segue amanhã, quarta (10), a partir das 9h da manhã na Casa Santa Cruz, Rua João Biazus, 510, Vila Tupinambá, em Passo Fundo.

Escrito por: Sônia Kaingáng, jornalista indígena independente, especializada em Educação, Diversidade e Cultura Indígena. Cobre temáticas indígenas em Educação, Patrimônio Cultural, Conhecimentos Tradicionais e Biodiversidade, tendo atuado profissionalmente em organizações indígenas nas regiões Norte, Centro-Oeste e Sul. Atualmente pelo Instituto Kaingáng – Inka.

O KUJÁ PEDRO GARCIA NA ABERTURA OFICIAL DOS TRABALHOS DA CONSULTA PÚBLICA JUNTO AO POVO KAINGÁNG DO RS, EM PASSO FUNDO. Foto: Sônia Kaingáng
LIDERANÇA DA TERRA INDÍGENA LOMBA DO PINHEIRO, ALDEIA FÁG NINH ORÉ, CACIQUE MOISÉS, PARTICIPA DAS DISCUSSÕES DA CONSULTA PÚBLICA EM PASSO FUNDO (RS). Foto: Sônia Kaingáng

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